Não...não é livro de leitura fácil e muito menos de
fácil compreensão. O romance de João Guimarães Rosa é o que se costuma dizer;
“uma pedreira”.
Estas anotações de leitura se basearam na edição de
2012 da Editora Nova Fronteira que é constituída por 608 páginas.
O livro, único romance de Rosa, é muito mais
comentado do que entendido. É muito mais comprado do que lido, e, entre os que
tentam a leitura, o articulista ousa palpitar, há uma desistência de no mínimo
noventa por cento antes que se atinjam as primeiras trinta páginas do livro.
O leitor, não iniciado na obra Roseana, começa a
leitura animado e com o máximo de boa vontade, mas depois de muito esforço e
desconforto para vencer dez ou quinze páginas, desiste frustrado, envergonhado,
duvidando do nível cultural que até então entendia ter, ficando-lhe uma espécie
de culpa, uma meia vergonha que, raramente confessa, por não ter conseguido ler
“Grande Sertão:Veredas”.
Entendo que a leitura do romance deve ser
diferenciada. Não basta fazer uma simples leitura, é necessário um estudo do autor.
Há regras básicas e preliminares que precisam ser seguidas. “Grande Sertão: Veredas”
se tornará de leitura menos difícil, se o pretendente a leitura do romance,
começar, primeiro, lendo as obras iniciais de Rosa, entre as quais, destaco os
livro “Sagarana”, “Corpo de Baile I” e “Primeiras histórias”. Sugiro mais...em
“Sagarana” começar com “A hora e vez de Augusto Matraga” e “Duelo”. No “Corpo
de Baile”, iniciar com “Campo Geral” que é a história de Miguilim. Em
“Primeiras histórias”, começar com “Os irmãos Dagobé” e “O famigerado”. Penso
que facilitaria muito o empreendimento maior; a leitura do imortal romance.
Em “Grande Sertão: Veredas”, a história não é
contada de maneira linear. A leitura do livro não segue nem respeita a
sequência do passar do tempo. O romance, também, não é dividido em capítulos, o
que torna a leitura, no meu entender, mais difícil. Pode-se perguntar: Valerá a
pena tanto esforço para conhecer o universo Roseano? Penso que sim. “Grande
Sertão: Veredas” é um livro único. Acredito que nunca mais se escreverá algo
semelhante, como também acredito que “Grande Sertão:Veredas” é uma obra para
todo o sempre.
ANOTAÇÕES
SOBRE O ROMANCE
Inicia-se
com Riobaldo já idoso, casado com Otacilia, morando na fazenda São
Gregório, que herdou de seu “padrinho”,
que na verdade era o seu pai. No entorno de sua fazenda reuniu, na condição de
amigos e meeiros, alguns dos companheiros, jagunços como ele nos tempos da
mocidade. Riobaldo está recebendo visita ilustre, possivelmente do autor do
livro, que esta em viagem para conhecer o Sertão. Entende que o visitante
chegou tarde, que o sertão já não é mais o Sertão e começa a falar do Sertão do
seu tempo, contando, de forma desordenada, passagens da sua vida. É isto, em
síntese, o romance
Deixa-nos,
patenteado,de cara, uma das suas grandes dúvidas; a existência ou não do diabo
e volta e meia questiona o seu interlocutor(que não se pronuncia, apenas
escuta) sobre o assunto. Registra, também, amizade feita, quando havia abandonado a jagunçagem; trata-se
do seu compadre Quelemém, que mora um pouco mais distante, é kardecista e seu
mentor espiritual. Por fim, fala de Reinaldo (Diadorim), por quem sentia uma atração
amorosa muito grande, coisa que homem macho só pode sentir por mulher e que
escondia e contra a qual lutava desesperadamente.
O
INÍCIO DA NARRATIVA
Começa a narrativa da sua vida, pelo meio da sua história,
quando, sob a chefia de Medeiro Vaz, o bando tentam surpreender Hermógenes,
antigo companheiro que, revoltado, vinga-se
assassinando o chefe de todos, Joca Ramiro. Medeiro Vaz, antes de
alcançar o seu objetivo,já envelhecido e doente morre. Riobaldo recusa a
indicação dos seus amigos para ser o sucessor na chefia. Quando menos se
espera, torna a aparecer Zé Bebelo, com mais alguns homens que, sabendo da
empreitada de Medeiros Vaz, volta ao bando para participar da vingança contra
Hermógenes, e, diante da recusa de Riobaldo, assume a chefia do bando.
Riobaldo faz, então, digressão na narrativa e
lembra, a sua meninice pobre, até os14 anos, junto da mãe. Narra seu encontro
com o Reinaldo, menino da sua idade, porém rico e de seu passeio com Reinaldo,
de canoa, nas águas do São Francisco. Fala da morte de sua mãe e do seu envio
para a Fazenda São Gregório do seu padrinho Selorico Mendes. No dizer de
Riobaldo, “a minha vida mudou para uma segunda parte”. Na fazenda do Padrinho
recebe fino trato e é mandado (era analfabeto) para estudar na cidade. Anos depois,
estudos concluídos, é convidado para dar aulas a meninos de uma fazenda e se
apresenta como professor na fazenda de Zé Bebelo. Ao chegar lá, constata não
haver crianças. Era uma fazenda de treinamento militar para combater e
exterminar os jagunços do Sertão. Riobaldo se torna professor de Zé Bebelo, o
chefe, que era analfabeto e queria, com a façanha de derrotar os jagunços,
candidatar-se e eleger-se deputado.
Depois de algum tempo, já tendo tomado afeição e
admiração por Zé Bebelo, aceita convite para participar da tropa comandada por Zé Bebelo
que vai partir para acabar com a jagunçada no Sertão. Com Zé Bebelo
presencia o ataque aos jagunços de Hermógenes que fogem após muitas baixas.
Posteriormente não apenas presencia, mas participa do ataque aos jagunços de Ricardão que,
também conseguem fugir. . Desgostoso com a matança que considera inútil dos
jagunços, resolve abandonar o “exército” de Zé Bebelo e sai pelo Sertão,
sozinho, sem destino certo.
A
ENTRADA NO GRUPO DE JOCA RAMIRO
Em estalagem encontra com alguns jagunços de Joca
Ramiro e entre eles reconhece Reinaldo, o menino que conheceu aos 14 anos. A
amizade entre os dois se reativa e Reinaldo leva Riobaldo para os comandados do
bando de Joca Ramiro. O primeiro contato é com o grupo de Hermógenes,que já
vira ser posto para correr por Zé Bebelo e, por quem, de imediato, nutre um mal
querer. Enquanto aguardam a chegada do chefe maior, o chefe de todos, Joca
Ramiro, vai conhecendo os outros chefes de grupos. Conhece a turma de Ricardão,
outro que ele ajudou Zé Bebelo botar
para correr. Conhece, também, os homens de Sô Candelário e de Medeiro Vaz entre
outros. Durante este período fica-lhe, cada vez mais claro o seu bem querer por
Reinaldo. Neste período conhece Otacilia com quem se compromete e, la na
frente, quando já havia abandonado a jagunçada, torna-se sua esposa.
A GUERRA CONTRA ZÉ BEBELO
Começa a combater, sob a liderança de Hermógenes, o
grupo de Zé Bebelo. Depois, passa para o comando de Sô Candelario e participa
da ação que derrota e prende Zé Bebelo que é levado a julgamento sob a
liderança de Joca Ramiro. Hermógenes e Ricardão votam pela morte de Zé Bebelo e
são votos vencidos, o que deixa Hermógenes muito aborrecido. Zé Bebelo é
libertado sob a condição de ir para Goiás e não voltar mais para a Bahia até
contra ordem ou morte de Joca Ramiro. Terminada a guerra, o grupo de mais de
500 jagunços se divide com seus respectivos chefes. Hermógenes e Ricardão seguem
com Joca Ramiro. Riobaldo e Reinaldo ficam no grupo de Titão Passos.
A
MORTE DE JOCA RAMIRO
Passam-se dois meses e chega notícia da morte de
Joca Ramiro, assassinado em emboscada, com tiro nas costas por Hermógenes que
guardou mágoa, contrariado com o julgamento de Zé Bebelo.
Todos os grupos, se dirigem para o encontro com Sô
Candelário e seus trezentos jagunços. O grupo já está reunido, faltando apenas
Medeiro Vaz que estava muito distante, quando cai em emboscada da polícia que
veio para vingar a prisão de Zé Bebelo. Após muita lutas e recuos, os jagunços,
decidem mandar um grupo para encontrar Medeiros Vaz que ficara encarregado de
vingar Joca Ramiro enquanto o grosso da tropa fica combatendo a polícia. Entre
os que vão ao encontro de Medeiro Vaz estão Riobaldo e Reinaldo. É neste ponto,
como já vimos, que o romance “Grande Sertão, Veredas” se inicia.
Medeiro Vaz parte em busca de Hermógenes para vingar
a morte de Joca Ramiro. Já envelhecido e
adoentado, morre no caminho. Reaparece, então, Zé Bebelo que, alforriado pela
morte de Joca Ramiro, sem mais o sonho de se tornar deputado, volta para ajudar
a vingar a morte de Joca Ramiro e assume a chefia no lugar do falecido Medeiros
Vaz.
NOVAMENTE
AO LADO DE ZÉ BEBELO
Percebendo a tropa exaurida, Zé Bebelo resolve dar
descanso em casa grande de fazenda abandonada e lá, sem esperar, são cercados
pelos jagunços de Hermógenes e Ricardão. Em desvantagens perdem muitos homens.
Zé Bebelo utiliza estratégia de mandar bilhete assinado por ele, informando a
presença ali de grande agrupamento de jagunço, ao promotor e ao delegado.
Riobaldo desconfia de traição. Quando os militares chegam pegam, de surpresa os
do Hérmógenes e Ricardão pela retaguarda o que dá a oportunidade a Zé Bebelo e
seus homens escaparem, rastejando, durante a noite. A estratégia armada por Zé
Bebelo havia dado certo. Mais pra frente conseguem montaria e seguem procurando
por lugar onde consigam arreios e munição.
Riobaldo entende que Hermógenes, para escapar sempre, só pode ter pacto
com o diabo e que para derrota-lo ele precisa, também, fazer o pacto.Vai,
sozinho, à meia noite para o meio do mato e invoca o diabo para o pacto. A
partir de então a personalidade de Riobaldo sofre grande transformação a ponto
de leva-lo a desafiar Zé Bebelo, seu ídolo, para poder ser o novo chefe do
bando. Zé Bebelo entrega a chefia e se retira do grupo que, agora sob a chefia
de Riobaldo, vai em direção à fazenda onde estão os parentes de Hermógenes,
para atraí-lo e concretizar a vingança de Joca Ramiro.
Diadorim percebe e fala com Riobaldo que ele parece
estar com o Diabo no corpo. Riobaldo se sente poderoso e não quer saber de
ouvir mais a ninguém, só faz o que sua cabeça manda. Reinaldo antes de se
afastar, diz a Riobaldo que quando eles consumarem a vingança, vai lhe contar
um grande segredo, o maior de sua vida.
O bando de Riobaldo atinge de surpresa a fazenda de
Hermógenes, mata os jagunços ali presentes, aprisiona a esposa de Hermógenes e passa a se preparar,
sabendo que o “Judas” virá para tentar salvá-la, para a grande e derradeira
batalha. Hermógenes vem e batalha
sangrenta se dá. Reinaldo se ataca com Hermógenes em briga de faca. A luta é
mortal para os dois. Ao lavar o corpo de Reinaldo,que ficou muito sujo de
sangue pelas facadas sofridas, Riobaldo fica sabendo que Reinaldo, na verdade
era uma mulher, que fora criada por seu pai como homem, para melhor protegê-la.
Curte luto pela dupla perda; a do amor que imaginava impossível e a morte de
Reinaldo. Recebe notícias do falecimento de seu pai e da herança que lhe deixou;
duas fazendas. Abandona a vida de jagunço, leva alguns com ele e vai se
instalar em uma das fazenda herdadas de seu pai. Casa-se com Otacília, conhece
Seu Quelemém e, já velho, recebe a visita “de homem ilustre” que é como se
inicia o romance.